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Slow Living, Long Living

Fazer o relógio andar mais devagar, ou dar-nos mais tempo para avaliarmos que, afinal, os ponteiros não correm, apenas nós tentamos enfiar um milhão de afazeres em cada segundo, congestionando o tempo e a paciência. Esta a premissa base do movimento slow movement, a refrescante sombra que abarca o slow travel, o slow school, as slow cities, o slow living e o percussor de todos estes slows, o slow food.

O slow é o novo fast

Podíamos, num rasgo de humor, dizer que o slow dancing, foi pioneiro nestas andanças, mas não foi e cabe-nos, aqui, usar de rigor, que o assunto é sério. Assim, deixemos os passos de dança e voltemos ao tema, falando a verdade, mas com ritmo, claro!

O primeiro passo neste caminho de lentidão e prazer feito foi o Slow food. Com algum humor e ironia, foi este o nome que o italiano Carlo Petrini, a quem se juntou um grupo de ativista, deu ao movimento que visou impedir a abertura de um McDonald’s em plena Piazza di Spagna, uma das mais célebres de Roma. Estávamos em 1986 e, desde então, não apenas o conceito vingou como cresceu e contagiou outras formas de ver, saber, ser, pensar e fazer. Ao recusar comida que vinha rápido e que, por isso mesmo, não vinha como a desejamos, fresca e local, com tempo para apurar paladares, mal servindo para enganar o estômago, mas que a todos enganou, iniciava-se uma recusa maior e mais abrangente, que impunha a urgência de um novo olhar para o alucinante ritmo de vida em que o dito mundo desenvolvido estava a cair, tal como a Alice, mas para um país sem maravilhas.

By Monoar Rahman Rony – Pixabay

Um movimento consciencioso – representado pelo pachorrento caracol –, que de tão óbvio e necessário ganhou estatuto internacional em 1989, em Paris, altura em que se assinou o manifesto Slow Food. Uma tomada de consciência que se propunha abrandar o ritmo, meter travões no frenético stress em que todos vivemos num mundo diagnosticado com a mais grave e neurótica das síndromes: a falta de tempo. Tempo para respeitar a natureza, a Natureza-Mãe e a de cada um, para estarmos com aqueles de quem mais gostamos, sem tempo para dar tempo ao tempo e o mesmo é dizer tempo para que os produtos agrícolas não encurtem fases de maturação, nem se adulterem as sementes, nem se contaminem as águas, nem se polua o ar, não se produza e consuma em excesso, não se manipulem genéticas… Tempo para pensar e repensar. Tempo para voltar atrás, recuar a ancestrais formas de saber e de fazer, recuperar saberes antigos, amigos do ambiente. Permitir que sejam os rebanhos a limpar as florestas, como outrora, que os legumes voltem a saber ao que deveriam saber, sem a pressa de estufas e químicos. Tempo para apreciar o planeta e, só assim, compreendê-lo e respeitá-lo. Tempo para ouvir e ser escutado. É tempo de parar. Abrandar. Viver devagar. Voltar a produzir com as mãos. Saborear. Apreciar. Tempo para nos apaixonarmos pelas maravilhas de um mundo que só corre aos nossos olhos. Que só obedece ao relógio que lhe impomos e ao qual damos desenfreadamente corda. Uma nova era que não recusa o progresso – que seria do futuro sem ele? –, mas que reavalia reais necessidades, instiga a boas práticas na hora de produzir e reintroduz o elemento humano em tudo onde ele é vital. Não. Não vamos reviver o passado, nem a isso nos propomos. Nem aqui nem em Brideshead, mas retiremos dele tudo aquilo que sempre fez sentido. Todo o sentido.

By Pixabay

Tudo se transforma, nada se desperdiça

Clareados os olhos, todos os sentidos os seguiram. Por cá, ganhou novo encanto o fado e o Cante Alentejano, a artesanal arte da olaria e as nossas preciosas andorinhas e tantas coisas de espantar de Bordalo Pinheiro. Netos replicam manualidades dos avós e a tradicional cestaria ou tapeçaria ou o desusado burel impõem-se pela mão da modernidade, usando o design e sangue novo como principais ferramentas. Reinventam-se formas para tornar eco-friendly os métodos de produção. Nascem os agro e ecoturismos. Tornam-se mais práticas e apelativas as funcionalidades de ontem. Pensa-se sustentável, faz-se sustentável, compra-se sustentável, exige-se sustentável. Encurtam-se distâncias ao usar aquilo que mais está à mão, ganha-se apreço peça fruta e legumes que são feios (mas saborosos, e que nos chegam de hortas locais, que não apanham trânsito nem aviões para chegar até nós) e que, apenas por isso, por não serem ‘bonitos’ e calibrados não chegam aos supermercados, acabando, em alguns casos, em desperdício (polpas, compotas e sumos, são outros destinos desejáveis). Desperdício, por seu lado, tornou-se na palavra feia que sempre foi, noutros tempos. Numa altura em que havia tempo para refletir sobre muitos disparates e que por isso mesmo os sabíamos evitar. Uma altura em que não desprezávamos a Terra, pois que dela dependemos. Tempo para imitar a Natureza, onde tudo se transforma, nada se perde. Tal como por aqui, na Oficina da Luz, onde nascem os candeeiros Light It Be.

O outro lado da nossa loucura

Vivemos num tempo em que o glamour da velocidade, do ritmo acelerado da vida citadina, da agenda apinhada de compromissos, começa a deixar perceber a tolice dos nossos hábitos, os bastidores da nossa estranha contemporaneidade. O desnecessário combustível que se consome para chegar mais rápido, a vida dos adultos que se veste, afinal, de stress, ansiedades e outras tantas neuroses, que os dias se preenchem, no fim de contas, de assuntos e coisas que em nada nos fazem felizes. Que adiamos sistematicamente aqueles dias de ‘qualidade’ com aqueles que mais amamos, quando esses momentos apenas podem surgir do somatório de muitas e muitas horas de partilha, convívio e intimidade. Que esses dias, que só a memória e o coração conseguem filtrar, não se podem marcar numa agenda, porque são espontâneos e não acontecem apenas porque os desejamos. Esse tempo requer de nós muito tempo. Tempo que lhe negamos e, um dia, acordamos e metade da vida está cumprida…

By Pixabay

Adeus toxinas

O slow, na verdade, é um antioxidante, um tratamento de reabilitação da mente e da vida, que traz novas engenharias de pensamento às atividades de todos os dias, e novas arquiteturas do saber e do saber fazer. Um conceito onde cabe bem qualquer coisa como o slow design ou slow deco. Aquele que também requer o seu tempo. Que é pensado para cumprir funcionalidades sem ferir o planeta. Que pretende ser necessário e bonito, mas sem poluir – como toda a fruta e todos os legumes que nos chegam do pomar do Sr. Zé e da horta da D. Rosa o são. Que não é feito em massa, para todos, apenas para aqueles que o desejam, e assim se contraem desnecessidades. Que é racional e, por isso, sustentável. Que não fere. Que é feito à mão e com carinho. Feito e recebido com paixão. E que por tudo isso se distingue do fast design (feito em série para ser barato e lucrativo), onde se pretende que todos caibam, mas onde ninguém verdadeiramente se encaixa.

Não temos de parar tudo aquilo que estamos a fazer, mas urge avaliar a forma como o estamos a fazer e a que custo. Porque o fazemos e com que propósito. Estamos a ajudar-nos? Estamos a ajudar os outros? Estamos a ajudar o planeta? Uma boa bitola, para separar todo o trigo do joio, é perceber se aquilo que fazemos nos apaixona e orgulha. Se não é o caso, porque não procurar outras coisas com que ocupar o nosso precioso tempo, verdadeiro diamante dos nossos dias? O universo está cheio de possibilidades. Seja a cavar a terra, a criar candeeiros a partir de madeira abandonada, seja a desenhar, a escrever um livro, a inventar uma receita, a criar animais de capoeira felizes, a construir o futuro em frente ao computador ou a pilotar-nos pelo espaço. A escolha é nossa. Só nossa. Porque quando nos empenhamos, algo de bom acontece.

Vamos dançar um Slow?

By Thomas B. – Pixabay

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